sábado, janeiro 06, 2007

O pessoal queixa-se que ando a escrever sem parágrafos, o que vindo de uma pessoa que, apesar de gostar, tem constantes lutas interiores para conseguir ler Saramago é algo inusitado.

(PALAVRA NOVA! PALAVRA NOVA! - Lá se vai o profissionalismo todo

inusitado
do Lat. inusitatu
adj.,

desusado;
desconhecido;
estranho;
novo;
extraordinário;
invulgar.)

Faz-me lembrar um pouco as teorias de evolução de Lamarck...

Teorias à parte, deixo uma coisita que escrevi há tempos numa aula mas à qual nem liguei mais, estranho ou não ficou cá no subconsciente e hoje a propósito de não sei o quê, saiu-me... Lembrava-me dela... Pronto, foi inusitado... :P

"Não sei. Não sei. Não sei. Mil vezes não sei. Nem saberei. Nunca. Os caminhos que percorro."

quarta-feira, janeiro 03, 2007

Viseu Revisited (2007)

«São sete horas aqui e não sei que horas são para onde tu foste. A cidade dorme lânguida, como um gato que pausadamente se estende ao sol. Passeio sozinha como de todas as vezes desde que partiste. Sozinha conto os passos que tantas vezes contámos juntos. Pelas mesmas ruas. Pelo mesmo ar carregado de tílias. E sob a mesma imponência de azulejos brancos e azuis daquela parede que nos fazia sombra. Suspiro. Mais um ano de tantos, de tantos mais que virão. Um ano em que tudo se reduz a nada e certezas não serão mais que parcos luxos de uma vida que já não terei. És um vulto de fumo que me acompanha. Fere-me a tua ausência como se corresse descalça sobre os vidros partidos das ruas da cidade. É a vida. Será a vida. É o que dizem. Liberto-me do jugo escuro da parede de azulejos e vejo, de novo, o sol. Tento convencer-me de que serei forte e conseguirei viver tanto quanto as nossas memórias. Eternamente. Sorriso interior. Quero ver além de ti, além de mim, além de todos. Quero ver o que não vejo agora por ter medo de cortar as amarras com que tanto me prendi e que começam a fraquejar por causa da minha fome de tudo. Uma de muitas árvores leva-me o sol para longe de novo. Nunca conseguirei ver além de ti e além dos outros. Não me contentaria com breves passagens de um mundo que tive e que deixei para trás. Não quero perder. Não quero perder mais do que perdi até agora. Não saberia viver apenas de vozes dentro da minha cabeça. A saudade. Tu foste. Porque é que eu não consigo? De novo o sol da manhã. Sentirei falta do cheiro a tílias de madrugada, de cumprimentar as pessoas na rua, de conhecer pessoas na rua. Mas haverão novos cheiros, novos cumprimentos, novas pessoas. Terei tantas amarras para onde for como aqui. Serei novamente eu, e terei novamente o que recordar. Não abandonarei nada nem ninguém. Viverei mais apenas. Diferença de luz repentina que me leva a fechar os olhos dois segundos. Dois segundos apenas. É sombra mais uma vez. Outra árvore. Não precisarei de olhar para sentir os seus ramos velhos e pesados, pois sei que lá estão. Sento-me num dos bancos verdes e observo as pessoas. Algumas alimentam meia dúzia de pombas que vão chegando. Não terei asas para tanto voo. Não terei força para tanta vontade. Não serei nada nem ninguém. E custa-me saber que, daqui a um ano, Viseu, será apenas uma cidade ao longe.»


Era um trabalho para Português. Ao mesmo jeito de "Lisbon Revisited" de Álvaro de Campos, tínhamos que escrever um texto onde evidenciássemos o constrante da angústia existencial com o optimismo, e como nos sentíamos por deixarmos esta escola este ano. Este não é a peça final, pois não fiquei deveras contente com ele, mas cá está a ele, a pedido e conselho do meu mais fiel leitor, que me aconselha em tudo. Obrigada, P!

*