terça-feira, junho 06, 2006

D.Q.N.C. - parte 4

«Fiz o mínimo de ruído possível. Sei que tens o sono leve e, hoje, já houve desentendimentos que chegassem. Sinto-me tão infantil! Eu até sou daquelas pessoas que ficava frustrada quando diziam “sonha comigo que eu vou sonhar contigo” porque nunca fui capaz de me lembrar de sonho nenhum, e agora acontece-me isto! Mas é tão real, o teu cheiro nas minhas entranhas, a tua voz a fazer estremecer o fundo da minha espinha. Talvez um leite morno me acalme. Olho para o relógio, 01:37, e eu sem sono nem vontade de dormir. Amanhã, felizmente, não trabalho.
Não há leite no frigorífico, aponto no post-it que está colado no armário e vejo a minha a letra contrastar com a tua. Sempre contrastámos, mas gosto que seja assim. Em alternativa ao leite morno decido sentar-me em frente ao computador portátil. Abro a porta do escritório e sou atacado pelo intenso cheiro a tabaco, tusso, começo a levar-te a sério quando dizes que tenho que deixar de fumar. Inevitavelmente fico sentado em frente à janela que dá para o Douro mas não manifesto qualquer interesse, caí em mim. Escrevo qualquer coisa para te dar, compensar momentos como este em que me aturas com uma devoção e paciência dignas de pouca gente.
- Que dizer senão que te amo?
Rebusco nos meus pensamentos em busca de uma palavra-chave, uma frase, qualquer coisa por onde possa começar, escrever-te as minhas confissões por mais banais que sejam.

“Revejo-me no abraço desses momentos a sépia”

Não tenha a certeza se gosto, apesar de saber que vais gostar, sempre gostaste, sempre me apoiaste. Lembras-te quando eu tentei arranjar uma editora para publicar um romancezito de meia tigela que escrevi há uns anos atrás? Nunca o leste, não quiseste, mas apoiaste-me incondicionalmente, pousavas a tua mão na minha e sentia-me renovado, protegido pela força interior que encerras dentro de ti. E os teus olhos verdes a brilharem, o teu cabelo a cair-te sobre a cara, o teu pescoço nu e comprido, os teus lábios ternos que me sorriem… A tua dança no… Não, não…

…a tua…

Não, não posso, desta vez não. Quero manter-me na realidade, porque este sonho ou pesadelo que me envolve não me deixa escapar. Traidoras e tristes as solitárias sereias do rio que me consomem!

…dança no…

Resisto. O teu corpo nos lençóis. A tua preocupação. Desta vez não te vou chamar, não posso fazer-te isso, estou a dar cabo de ti e de mim também, a tua essência sufoca-me e já não reconheço a tua voz, a escuridão assola-me e sinto-me em queda permanente. Salva-me agora antes que me perca para sempre.

…Douro.

Não consigo mais. Não te posso chamar, não te posso fazer sofrer. O Douro. A tua dança. Os teus cabelos. A essência que me sufoca. Não és tu, agora tenho a certeza que não és tu. Já não me chamas, ordenas-me que me aproxime, que salte a janela e voe para o fundo escuro do rio. Nunca vi o teu nome adequar-se tanto à minha condição de perdido, vou ter que te chamar, só tu me podes acordar deste pesadelo…»

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

ai jesus! o homem está a ficar tolo =/ lol xD*

porque fica ele assim? (de certeza que não vou saber tão depressa, mas nunca é de mais perguntar =P)

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11:47 da manhã  

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